terça-feira, 31 de janeiro de 2012

A Primeira vez que fui à Toca da Raposa


Há certos momentos que ficam indelevelmente marcados na memória de cada um. Eu sei exatamente onde estava, como estava vestido e o que fazia na noite de 30 de julho de 1976: estava em Aimorés-MG, na casa de minha avó, usava uma camisa de malha azul com cinco estrelas no peito e aguardava ansiosamente acabar a novela das 08:00hs (acho que era Duas Vidas) para que começasse a transmissão de Cruzeiro x River Plate direto do Estádio Nacional de Santiago do Chile. Transmissão ao vivo pela TV era coisa rara, ainda mais em Aimorés, que fica na divisa de Minas Gerais com o Espírito Santo, às margens do Rio Doce. Mas, naquela noite, a sorte sorrira para mim e eu estava pronto para assistir o jogo mais importante da vida do Cruzeiro até então. 
Acabado o capítulo da novela, minha avó se retirou para o seu quarto e fiquei sozinho na sala assistindo o jogo. TV em preto e branco e com uma folha de papel celofane azul em frente à tela, para dar a impressão de ser uma TV colorida. Era muita emoção! Eu gostaria muito que meu pai estivesse ali junto comigo naquele momento, mas ele, por motivo de trabalho, havia ficado em Belo Horizonte. É horrível assistir um jogo tão importante sozinho.
Bem, começou o jogo e a TV Telephunken transmitia a todo o vapor. Aos  24 minutos do primeiro tempo Nelinho abriu o marcador que assim permaneceu até o intervalo. Na volta do jogo, entre o décimo minuto e o vigésimo, fui do êxtase à loucura, com Eduardo fazendo o segundo do Cruzeiro e em menos de três minutos o River Plate empatando o jogo. Sufoco atrás de sufoco, Raul dando seus golpes de vista (ele tirava as bolas só com o olhar), Joãozinho dando um baile e a defesa lutando muito, quando de repente, aos 40 minutos... Acabou a luz! Meu Deus! E a luz não voltou. Dormi sem saber se éramos campeões ou não.
Àquela época, para se telefonar de Aimorés para Belo Horizonte, era uma epopeia bíblica! Ligava-se para a telefonista da cidade e ela nos dava uma previsão de quanto tempo demoraria para efetuar a ligação, que às vezes esperava-se cinco horas! No dia seguinte, pedi a ligação para Belo Horizonte e saí para ver se conseguia comprar um jornal que falasse o resultado. Somente havia jornais do Rio de Janeiro. Nem me lembrei que a Rádio Aimorés era afiliada da Rádio Itatiaia e que lá conseguiria tal informação. 
Moral da história: somente depois do almoço consegui falar com meu pai, que já atendeu gritando a manchete do Diário da Tarde daquele dia: TUDO AZUL NA AMÉRICA DO SUL! Me contou em detalhes como Joãozinho marcara o gol do título, como ficara nervoso ao ver que o moleque chutara a bola que deveria ser chutada por Nelinho. Acho que poucas vezes ouvi a voz de meu pai soar tão entusiasmada!
Gozei a cara de todos os primos, a maioria flamenguista, que não deram muita bola para a conquista, pois, afinal, a Libertadores não dava muito IBOPE aqui no Brasil.
Bem, voltei para Belo Horizonte, chacoalhando em um vagão da Vitória-Minas, feliz igual pinto no lixo devido à vitória maravilhosa. Infelizmente não consegui assistir o vídeo tape do gol de Joãozinho. 
Meses após a conquista, recebi a visita de meu primo Adelmo, carioca, filho de um conselheiro do Flamengo, que queria muito conhecer a Toca da Raposa, que à época era o melhor centro de treinamentos da América Latina, frequentada pela seleção brasileira. Consegui um convite, pegamos o ônibus e começamos nossa aventura para chegar naquele fim de mundo. Naquele tempo, as linhas de ônibus não chegavam até a Toca da Raposa. O máximo que iam era até a praça São Francisco, e de lá fomos a pé até o CT.
Quando lá chegamos, o porteiro já nos desanimou dizendo que não havia nenhum jogador presente, que estavam todos em viagem para algum compromisso do time. Além do mais, não havia, como hoje em dia há na Toca da Raposa II, monitores explicando os detalhes do centro de treinamento. Fomos explorar os prédios e campos. Em todo o lugar imaginávamos os jogadores em ação: as traves onde Raul treinava suas defesas, as escadarias onde Joãozinho e Darci faziam suas resenhas após as refeições, a cadeira na qual Piazza assentava para almoçar, a sala de cinema onde Zezé Moreira dava suas preleções, a capela onde Eduardo fazia suas orações e assim íamos suprindo a ausência dos craques com nossa fértil imaginação.
Quando estávamos na porta da sala de cinema, fomos advertidos por um empregado da Toca de que a partir dali não poderíamos ir adiante, pois ali começava o setor de quartos da concentração. Era local restrito e vedado ao público. Assim que o empregado se retirou, meu primo, carioca esperto, abriu a tal porta e entrou resoluto. Eu, bom mineiro, obediente às normas, me desesperei e tentei puxá-lo de volta. Ele, irredutível foi corredor adentro e para meu maior desespero, abriu uma das portas dos quartos.
O quarto não estava vazio. Havia uma pessoa dentro. Havia um jogador dentro. Havia o Joãozinho dentro do quarto! Aos quinze anos de idade quase enfartei! 
Não sabia se ria ou me desculpava. Meu primo, carioca esperto, já entrou se assentou na cama ao lado da de Joãozinho, se apresentou, me apresentou e elogiou a molecagem que nosso camisa 11 fizera na final da Libertadores da América. Joãozinho gostou do papo de meu primo e começamos a fazer uma belíssima resenha. Ele contou em detalhes como acontecera o gol, como Nelinho quis pegá-lo de tapas mesmo com a bola no fundo da meta. Contou que o técnico o chamou de irresponsável uma dezena de vezes no vestiário e que, se fizesse aquilo de novo, seria um eterno reserva enquanto ele fosse o treinador.
Eu não sabia se estava acordado ou vivendo um sonho!
Após uns quinze minutos de conversa nos despedimos e fomos embora para casa. Àquela altura, tendo conversado com Joãozinho, tudo o mais era muito pouco. O caminho entre a Toca e a Igreja da Pampulha passou em um minuto, pois tínhamos assunto demais para conversar. Como agradeci ao Adelmo a sua ousadia em abrir aquela bendita porta! Como era bom ter um rpimo carioca, garoto esperto!
Voltei a encontrar Joãozinho em 2005, na Agência Renascença da Caixa Econômica Federal, onde o craque foi receber o valor do FGTS de quando fora jogador do Cruzeiro. Aliás, há tantos clubes que não pagam nem o FGTS dos jogadores que estão atuando, e o nosso Cruzeiro pagou o FGTS de todos os ex-jogadores que por lá atuaram. Perguntei ao craque se lembrava da história e, por educação (ou medo de não receber seu dinheiro...) disse que se lembrava muito. Ele pode ter esquecido, eu não.
Algum tempo depois, houve uma cerimônia no Bar do Cruzeiro, na Savassi, onde ex-atletas receberam credenciais para assistirem jogos do Cruzeiro, sem pagar ingresso. Haviam muitos ex-craques e o Departamento de Marketing preparou uma belíssima festa. Nos telões passaram vários gols de todos os tempos, entre eles, o gol de Joãozinho, daquele longínquo 30 de julho de 1976. Após trinta anos de espera, consegui ver o gol que a falta de luz me impedira de assistir ao vivo. Parodiando Camões, acho que mais trinta anos esperaria, pois para tão grande amor ao meu Clube tão curta vida!

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Pão e futebol!

No dia 19 de junho de 1996 saí cedo da Caixa em Sabará por dois motivos: o primeiro foi que estava tremendamente gripado, com dores no corpo, muita coriza e também espirrando muito; o segundo, e principal, era que naquela noite seria disputada a final da Copa do Brasil. 
O primeiro jogo havia acontecido no Mineirão e tinha terminado empatado em 1x1. Com isso, a vantagem do empate sem gols era do Palmeiras no jogo de volta que seria disputado em São Paulo no Palestra Italia.
Como disse o jornalista Juca Kfouri em determinada ocasião, tirando a apaixonada torcida cruzeirense, todo o Brasil sabia que o Palmeiras iria vencer e se sagrar campeão. Afinal, o Palestra de São Paulo possuía, disparado, o melhor time do Brasil e quem sabe, do mundo! Os italianos de São Paulo conseguiram um patrocínio da empresa italiana de laticínios Parmalat que lhes possibilitou montar uma verdadeira seleção brasileira. A escalação do time que jogou naquela noite foi simplesmente: Veloso, Cafu, Sandro, Cléber e Júnior; Cláudio, Amaral, Marquinhos, Djalminha, Rivaldo e Luizão! O técnico era o performático Wanderlei Luxemburgo, à época, o manda chuva entre os treinadores.
O Palestra mineiro também tinha um belo time, mas não dava para comparar individualmente com o irmão paulista. Jogamos com Dida,Vitor, Célio Lúcio, Gelson Baresi e Nonato; Fabinho, Ricardinho, Cleisson, Palhinha,Marcelo Ramos e Roberto Gaúcho. A apaixonada torcida Cruzeirense sabia que o futebol é um espote coletivo e não individual.
Bem, cheguei em casa, liguei a TV no canal da Bandeirantes, que era o que transmitia a Copa do Brasil, e comecei a lanchar. Minha esposa veio assentar ao meu lado e reclamou que não havia pão em casa, pois eu não tinha passado na padaria quando vim de Sabará. Expliquei que vim direto porque estava muito gripado. Ela retrucou que apesar da gripe estava pronto para assistir futebol na TV. 
Ah! As esposas... Sempre com respostas prontas para todas as ocasiões onde precisam demonstrar que são fundamentais em nossas vidas!
Tive vontade de dizer que centenas de amigos Conselheiros haviam fretado um avião e que naquela hora estavam em São Paulo para assistirem o jogo, e que eu não fora por causa da gripe. Mas fiquei quieto. Com certeza ganharia mais alguma frase de efeito.
À medida que se aproximava mais a hora do início da partida, o narrador Sílvio Luiz mais demonstrava a sua tendência para dar o título antecipadamente para o Palmeiras. Como aquilo me irritava! E como a Beatriz contribuía sobejamente para aumentar mais ainda a minha irritação! Em determinado momento ela veio me atormentar e soltou uma pérola: Não tem pão. Suas filhas vão ficar sem pão no café da manhã! Onde já se viu? Uma casa que não tem pão! Ah! Mas futebol na televisão tem. Acho que você gosta mais do Cruzeiro do que de sua família!
Meu Deus! Que coisa irritante! Aliás, o que era mais irritante, Beatriz ou Sílvio Luiz? Rimou! Bem rimou e começou o jogo. O Palmeiras atacando e o Cruzeiro se virando, se defendendo e lutando.
De repente, aos cinco minutos Luizão abre o placar! Eu gritei: Não, não, mil vezes não!
Beatriz correu para a sala e falou: Eu sabia, não comprou pão, foi castigo! 
Naquela hora o sangue talhou nas veias e soltei um sonoro palavrão, que mesmo em italiano faria muito sucesso entre os leitores. Gritei tanto que ela, sem graça, se recolheu e foi dormir.
Sozinho na sala, fiquei torcendo e sofrendo, vendo a Bandeirantes mostrar as janelas dos prédios vizinhos ao Parque Antártica piscando as luzes em sinal de contentamento. Que sufoco!
Porém, aos vinte e cinco minutos da etapa inicial, Roberto Gaúcho dá uma caneta no Amaral e marca um golaço! 
-É do Cruzeiro! Foi, foi, foi... foi ele! Roberto Gaúcho! O craque da camisa onze! Gritou sem muita convicção o narrador palestrino paulista.
No segundo tempo foi o massacre da serra elétrica. Como o Palmeiras massacrou o meu Cruzeiro. E como Dida se agigantou e fechou o gol. Pegou tudo, até pensamento!
Bem, o jogo já se encaminhava para seu final e para os pênaltis, quando Roberto Gaúcho cruza uma bola na área, Veloso sobe soberano para fazer uma defesa fácil e... deixa a bola escapar que cai nos pés do matador azul Marcelo Ramos que fuzila as redes palmeirenses. O que o Silvio Luiz gritou?
-Eu não acredito! Isso não pode estar acontecendo! É do Cruzeiro...
Meus amigos, que momento sublime! Como descrever a sensação que eu e mais alguns milhões de Cruzeirenses estávamos sentindo naquele momento? Aliás, é bom dizer que somente nós estávamos sentindo, pois como disse Juca Kfoury, somente os Cruzeirenses mais apaixonados  esperavam uma vitória do Palestra Mineiro. Como é bom, Juca Kfoury, ser Cruzeirense!
Bem, o final do jogo vocês já sabem: São Dida fechou o gol e ganhamos, vencemos e fomos campeões mais uma vez.
Eu não me continha, queria abrir a janela, gritar, cantar, o que fosse, quando o telefone toca. Era meu cunhado Luiz me dizendo que a comemoração no bar Amoricana, na Savassi, estava bombando e que era para eu ir para lá comemorar.
Não pensei duas vezes e saí bem depressa. Fiquei no Amoricana até as duas da manhã e voltei para casa.
Chegando em casa, tomei um banho e fui me deitar. Beatriz meio sonolenta me perguntou: Você saiu? Onde foi?
Recebeu uma resposta "na lata": Fui comprar pão. Rodei todas as padarias de Belo Horizonte e não achei nenhuma aberta! Ah! Por essa você me paga!
No dia seguinte fui trabalhar e mandei fritar torresmos, no restaurante Cê qui Sabe, em Sabará. Servi torresmo para todos os meu clientes naquele dia vinte de junho! Começamos comendo porco na noite anterior e continuamos comendo porco por todo o dia seguinte!
Que dia de glória! E a gripe? Que gripe? Sarei!

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Enquanto a torcida do Cruzeiro comemorava...

Minha atuação dentro do Cruzeiro sempre foi mais ligada à área financeira. Antes mesmo de ser Conselheiro do Clube já participava da vida financeira do Clube à medida que, como Gerente da Caixa e da conta do Cruzeiro, assessorava tanto o diretor financeiro, Aristóteles de Ávila, como ao supervisor do departamento de futebol Benecy Queiroz. Propus algumas melhorias nas rotinas internas do Clube e a que mais me envolvia diretamente era a de ir ao Mineirão para, após as partidas, recolher o valor arrecadado com a bilheteria e entregá-lo ao carro-forte. Já comentei em outro texto, que anteriormente o valor era colocado no malote de roupa suja e levado para a Toca da Raposa para ser depositado no dia seguinte. Um perigo!
Por causa dessa minha rotina, eu havia ganhado uma autorização do Cruzeiro e da ADEMG para estacionar meu carro dentro do estádio. Antes dessa autorização, parava meu carro normalmente no estacionamento do estádio e ia assistir o jogo. Quando o jogo era à noite, no horário bizarro de 22:00, era uma perigo para mim, pois às vezes parava o carro bem longe do portão de número 2, e quando saía após liberar a renda, já eram 02:00 da madrugada e meu carro estava sozinho no meio do estacionamento.
Pois bem, no dia 09 de julho de 2000 me preparei desde cedo para o jogo importante que o Cruzeiro teria naquela tarde. Naquele dia, aconteceria no Mineirão, nada mais, nada menos que a final da Copa do Brasil! O Cruzeiro enfrentaria o São Paulo, grande rival e time de muitos craques como Rogério Ceni, Belletti, Marcelinho Paraíba e Raí! 
O Nove de Julho é uma data muito importante para os paulistas, pois relembra o dia em que São Paulo se rebelou contra o governo federal pleiteando uma nova constituição, pois a revolução de 1930 tirara dos estados muito de sua liberdade. É a maior data cívica paulista e relembra os combates ocorridos, principalmente, na divisa de São Paulo com Minas Gerais, que lutara defendendo o governo federal.
Pois bem, um novo combate entre paulistas e mineiros estava previsto para um novo nove de julho, só que dessa vez sem derramamento de sangue e na arena esportiva!
Aquele domingo começou um pouco diferente para mim. Acordei cedo, cuidei dos cachorros, podei algumas plantas e fui lavar a calçada. Já que estava lidando com água, resolvi lavar meu carro, coisa que não fazia há muito tempo! Porém, o carro que tinha à época foi o mais bonito e confortável que já tive: era um Tempra SW italiano. Bonito demais! Valia até a pena gastar algum tempo lavando e polindo-o. Foi o que fiz, e ficou uma belezura. Digno de uma final de campeonato!
À tarde saí para o Mineirão no carro lavado e polido. Parecia até o presidente do Clube. Ao chegar em frente ao portão 2, percebi que teria dificuldades em estacionar meu carro dentro do estádio. O próprio comandante da PM, Coronel Severo, em pessoa, coordenava aquela esbórnia que se transformara a entrada de veículos credenciados. Para variar, credenciaram mais veículos do que cabia no espaço. Coisas de dia de decisão... O Coronel pediu que me dirigisse ao portão 13, do outro lado do estádio, onde minha credencial valeria também. Assim, no meio da confusão de gente, cavalos da PM, ambulantes, cambistas e afins, dei ré e me dirigi ao portão 13. Entrei e estacionei o carro logo embaixo do estádio. Ao sair e olhar para cima, vi a torcida do São Paulo na murada olhando para baixo e para meu carro. Não tive um bom pressentimento... Bem, como dizia meu bom avô, "o que não tem solução já está solucionado". Com a sua lembrança acesa em minha memória, subi para as cadeiras cativas também pedindo a proteção de São Sebastião para o meu carrinho que tinha ficado à mercê dos amigos paulistas.
Começou o jogo e como o anterior, em São Paulo, havia acabado empatado sem gols, um empate com gols daria a taça ao Tricolor Paulista. Assim sendo, era promessa de grandes emoções, o que realmente ocorreu, dentro e fora dos gramados. Final de primeiro tempo: zero a zero. Início de segundo tempo: jogo disputadíssimo e a torcida do Cruzeiro fazendo uma pressão enorme. Aos 29  minutos Marcelinho Paraíba faz um gol que calou o Mineirão. Eu, particularmente, fiquei possesso pois creditei tal gol mais ao goleiro André do que ao craque são paulino. Eu, e a maioria da torcida cruzeirense, achávamos que o André tinha os braços curtos, pois volta e meia chegava atrasado nas bolas. 
A torcida mais corneta que o Cruzeiro sempre teve, foi a das cadeiras cativas. Como reclamam e como torcem pouco! A partir daquele gol começou o calvário de meus ouvidos que tiveram que ouvir pérolas do tipo: O Levir não ganhava nada aqui e agora ganha tudo no São Paulo, culpa do Perrella! Ou ainda: Ficam insistindo com esse menino Geovanni... Fora Marco Aurélio, burro! burro!
Bem, foi uma ducha de água fria, pois, como disse antes, o empate dava o título ao São Paulo e naquele final de jogo estávamos perdendo. Festa tricolor. Pelo menos o meu carro não sofreria tanto após o jogo com a comemoração deles. Era o que eu esperava.
Bem, entrou o Fabio Júnior em campo e empatou aos 35 em jogada magistral de Müller que também havia entrado. Explodiu o Mineirão! Diminuiu o ritmo da torcida são paulina. Aumentou o meu receio com meu carro...
Aos 45 minutos a torcida dos paulistas estava já comemorando o título quando Geovanni, aquele muito novinho que o irresponsável do técnico colocara para jogar, sofre falta e, aconselhado por Müller bate magistralmente e sela definitivamente a conquista do título.
Ôpa! Somos campeões! Ôpa! Meu carro debaixo do local de concentração da torcida tricolor! Saí correndo para tirar meu carro de lá, porém alguém levanta uma bola na área do Cruzeiro e o atacante do São Paulo cabeceia sozinho! Valei-me São Sebastião! E valeu-me mesmo! Não é que o goleiro de braço curto pegou magistralmente? Fez defesa de final de Copa do Mundo! Bem, afinal era uma final de Copa do Brasil. Valeu! Valeu! Simon termina o jogo de uma maneira teatral, como só ele sabia fazer e lá vou eu escada a baixo. Eu não sabia que a PM iria reter os paulistas após o jogo na arquibancada.
Ao chegar em frente ao meu carro, deparei com um cena dantesca. Antes ainda do jogo, nossos amigos tricolores jogaram todos os restos de suas "quentinhas" de tropeirão em cima do meu Tempra SW italiano lavado e polido! Ficou o carro mais "mixido" de Minas Gerais! Cobriram o capô, o vidro, a capota, enfim, transformaram meu carro numa quentinha mesmo. Até a cor prateada dele ajudava a compor a cena.
Pensei comigo: se fizeram isso antes do jogo, imagina agora que perderam de maneira tão impressionante. Vou tirar meu carro daqui!
Entrei no carro, liguei o limpador de parabrisas, joguei áqua, mais água e muito mais água e coloquei o carro entre os caminhões da Rede Globo. Os operadores da Globo que ficam nos caminhões foram todos ver meu carro "mixido". Foi até motivo de comentário no jornal do dia seguinte. 
Com o carro em segurança (?) voltei para as cativas e comemorei até! 
Depois das comemorações fui para a tesouraria providenciar a expedição do dinheiro da renda. Enquanto trabalhávamos, começaram a chegar as notícias de que a toricda tricolor ficara furiosa não só com o resultado do jogo, mas com a ordem do Coronel Severo de segurá-los até mais tarde, retidos na arquibancada. quando foram liberados, quebraram os banheiros, as portas dos bares, placas e muitas outras coisas. Enfrentaram a polícia e travaram uma batalha campal contra os policiais mineiros, bem ao estilo do nove de julho de 1932. 
Naquela hora, agradeci a São Sebastião que me aconselhara a tirar o carro de lá! Valeu Santo Cruzeirense!
Ao terminar o trabalho e remeter o dinheiro ao carro forte, fui buscar meu carro para ir a um lava-jato e depois ir para casa. Ao passar no local onde havia deixado primeiramente meu carro, quase caí para trás: no local jazia uma tampa de concreto de alguma caixa de esgoto de algum banheiro do Mineirão. Aquela placa de concreto devia pesar mais de cem quilos e fora arremessado do andar superior, onde ficam os bares. Vários veículos estavam amassados, inclusive um de uma rádio que tinha um vaso sanitário caído sobre o parabrisa e capô! Uma cena digna de filmes de terror!
Corri para os caminhões da Globo e ainda ganhei uma gozação de um global que disse que o tempero do meu Tempra estava cheirando muito bem.
Levei o carro para lavar em um lava-jato e no dia seguinte levei-o ao posto para uma geral por dentro e por fora. 
Duas semanas depois, fui a um casamento e minha esposa comentou ao entrar no carro: Seu carro está com cheirinho de alho...
É isso aí: Tudo pelo Cruzeiro! Hoje não trabalho mais com o recolhimento da renda. Hoje é tudo vendido antecipado, o que melhorou bastante, para o torcedor, para o Clube e principalmente para mim. Só assisto o jogo e está bom demais!





segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

A Confraria San Sebastian

São Sebastião é o padroeiro do Barro Preto. Foi soldado romano e foi martirizado pela sua inabalável fé e por não ter renegado o nome de Jesus. Sua igreja impera altaneira na avenida Augusto de Lima e está sempre de portas abertas para os devotos que a procuram atrás de momentos de reflexão e oração. Eu mesmo, quando trabalhava na agência Barro Preto da Caixa, sempre aproveitava alguns minutos do horário de almoço e ia para lá para meditar, rezar e pensar um pouco nas coisas do dia a dia.
Quando o Palestra foi fundado, houve a necessidade de se escolher um padroeiro para o Clube e vários foram cogitados. Porém o bom senso prevaleceu e o padroeiro do bairro virou também o padroeiro do Clube. São Sebastião é o padroeiro do Cruzeiro Esporte Clube.
Há pouco mais de dez anos um Conselheiro, muito atuante na vida do Clube, propôs a um grupo de amigos a fundação de uma confraria que reunisse os mais chegados em noites gastronômicas. Esse Conselheiro chama-se Hermínio Francisco Lemos e recentemente entregou o cargo de Presidente do Conselho Deliberativo a outro confrade.
O Parque Esportivo do Barro Preto está construído onde um dia foi o Estádio Presidente Juscelino Kubitschek, palco de memoráveis páginas heroicas e imortais. Após ser desativado, foi transformado em parque esportivo com piscinas, quadras e outros atrativos para os sócios. Porém, alguns lugares ficaram meio que escondidos devido a adaptações. Foi o caso do antigo bar do Buru, que atendia os torcedores e ficava abaixo das arquibancadas. Depois de desativado, virou um cantinho. E foi naquele cantinho que fundamos a Confraria San Sebastian. Algumas pessoas podem achar que o nome do santo está grafado em espanhol ou francês, mas não: é italiano legítimo. Ou melhor: é dialeto Friulano legítimo. No norte da Italia os dialetos têm como costume engolir as letras do final das palavras.
Os fundadores eram todos conselheiros natos e muito envolvidos nas lutas políticas do Clube. Dos que me lembro: Hermínio Lemos, Francisco Lemos, Gilvan de Pinho, Alvimar Perrella, Dr. Cesário, Délcio, Jairo Alves, Marcos de Brito, Ayres (esses três últimos já falecidos), Aristóteles, Wagner, Galvão, Moacyr, Getúlio e seu irmão João Carlos e vários outros amigos influentes na política Cruzeirense. 
A Confraria arrecadou um valor inicial com cada sócio e adquiriu equipamentos de cozinha industrial que foram colocados no antigo bar do Buru. A idéia era que a cada semana, sempre às terças-feiras, um dos confrades botasse o avental e preparasse o jantar. Assim começou, em um canto em desuso, a Confraria San Sebastian.
Eu não fui um dos fundadores mas comecei bem cedo. Acho que na segunda ou terceira reunião compareci, levado pelo querido Jairo Alves (que Deus o tenha em um céu bem azul), e nunca mais deixei de frequentar. A terça-feira é sagrada para mim e mais vinte e nove confrades.
Durante todos esses anos muitos novos confrades entraram e muitos saíram também. A maioria que saiu foi por discordâncias políticas e a que chegou foi por ver nas reuniões um ambiente sadio e influente nas decisões do Clube. Já barramos e incentivamos contratações de jogadores ou técnicos e também já animamos e desanimamos projetos. Tudo sempre bem discutido e havendo sempre o direito de discordar respeitado. E principalmente sabendo que o direito e dever de bem contratar sempre coube ao Presidente do Clube.Se o Cruzeiro fosse grego e não italiano, diria que a Confraria é a Ágora Cruzeirense.
A Confraria já forneceu elementos ilustres à direção do Cruzeiro. Dois presidentes do Clube já saíram de lá: Alvimar e Gilvan. Vice-Presidentes do Clube foram inúmeros, como Francisco Lemos, José Ramos, Biaggio Peluso, Marcinho Và Benne, que eu me lembre. Presidentes do Conselho Deliberativo tivemos Gilvan, Hermínio, Cesário e agora o Wilmer. No Conselho Fiscal também tivemos e temos membros da confraria, assim como na mesa diretora do Conselho Deliberativo.
A Confraria não nasceu com o propósito de ser um celeiro de bons nomes para a direção do Clube, mas com o tempo se tornou. É impressionante ver como suas reuniões, principalmente em época de campanhas eleitorais, ficam cheias de Cruzeirenses que lá acorrem atrás de boas discussões. A Confraria é uma caixa que repercute as tendências da política cruzeirense. Estando lá sabe-se como andam as coisas no Clube.
São Sebastião morreu por não querer recusar a sua fé. É um exemplo a ser seguido por todos os que batalham por suas ideias.
Parodiando a Rádio Itatiaia: Sebastião, soldado, mártir e Santo padroeiro da Confraria, velai por nós!

domingo, 22 de janeiro de 2012

Como nasceu o SADA Cruzeiro

No final do ano de 2008 tivemos eleições municipais em todo o Brasil. Em Betim a disputa se polarizou entre a vencedora Maria do Carmo e Rômulo Veneroso. O candidato a vice-prefeito na chapa de Veneroso era Vitorio Medioli, grande empresário ítalo-mineiro e muito amigo do prefeito que saía, Carlaile Pedrosa. Enquanto prefeito, Pedrosa usou muito dessa amizade viabilizando benefícios para a cidade, como por exemplo, a construção de um ginásio, totalmente bancado pelo Grupo SADA de Medioli. Com o escopo de minimizar a violência entre os jovens da cidade, Medioli adquiriu a estrutura do time de volei do São Paulo Futebol Clube, que estava se desfazendo da equipe, e fundou o SADA Betim que utilizaria as instalações do novo ginásio. A perda da eleição mudou os rumos do time de volei que se tornaria em pouco tempo a maior força do esporte em Minas Gerais.
A nova prefeita limitou a utilização do ginásio pelo time, o que inviabilizou o programa de treinamentos. Outras medidas contrárias ao time também foram tomadas, levando Vitorio a anunciar que o time deixaria Betim e tiraria o nome da cidade de seu escudo.
À época, já tinha uma grande amizade com o irmão de Vitorio, Alberto. Fazemos parte da diretoria da ACIBRA-MG que é a Associação de Cultura Ítalo-Brasileira de Minas Gerais. Alberto, juntamente com seu irmão Vitorio administra um dos maiores grupos empresariais de Minas Gerais e do Brasil e tê-los como apoiadores em projetos esportivos é uma oportunidade que nenhum clube pode perder.
O jornal O Tempo faz uma belíssima cobertura do volei e através do jornal, eu acompanhava a epopéia dos irmãos à busca de uma nova parceria para o SADA volei. Pensei várias vezes em levá-los ao Cruzeiro, mas infelizmente, tinha receio de criar problemas para mim mesmo, pois à época havia um setor dentro do clube especializado em detonar iniciativas que não fossem suas. O jornal todos os dias trazia novas informações e eu ficava impressionado com a inoperância dos clubes de Belo Horizonte que não procuravam o SADA.
Certo dia li uma declaração de Vitorio anunciando que fora procurado por um grande clube da capital que estava interessado em fazer uma parceria. Procurei me informar no Cruzeiro e vi que não seríamos nós. Na mesma edição do jornal havia uma reportagem com Bebeto de Freitas, que à época era dirigente do Atlético, falando sobre sua meta de transformar o clube alvi-negro em uma grande potência olímpica. Conhecendo o gosto de Bebeto pelo Volei e sendo seu conterrâneo, juntei as pontas das notícias e concluí que a nova equipe de volei reeditaria o sucesso que o Atlético teve na década de 1980 no cenário esportivo no estado.
Bem, eu não podia ficar parado vendo tal tragédia acontecer! Se o SADA fosse para a sede de Lourdes, em pouco tempo teríamos de escutar que, apesar de não ganharem nada no futebol, no volei eram imbatíveis.
A época do ano não ajudava. Me lembro até a data: 30/12/2008. Alberto estava para a Italia onde passava sempre as festas de fim de ano e Vitorio eu não o conhecia pessoalmente. Liguei para a secretária do Alberto e pedi o telefone de Vitorio. Claro que ela não poderia me dar o número do telefone dele. Me deu o número do telefone do Luiz (supervisor do SADA Volei) e da Andréa (comunicação e marketing). Liguei para eles e consegui o telefone do Vitorio. Liguei para o número fornecido pelo Luiz e Vitorio me atendeu no celular. É bom frisar que ele, como empresário muito compromissado, não atende o celular, só que naquele dia me atendeu (acho que a Andréa avisou que eu ligaria). Me apresentei, expus meus pontos de vista e perguntei se haveria interesse em conversar sem maiores compromissos. Ele topou imediatamente e marcou um encontro comigo no dia seguinte de manhã na sede campestre do Cruzeiro.
A parte seguinte era achar Zezé Perrella, que naquela data, deveria estar gozando férias em algum resort no litoral nordestino. Liguei, liguei e não consegui contato. É bom frisar que como pessoa muito compromissada, Zezé Perrella não atende o celular.
No dia 31 fui ao encontro de Vitorio na campestre e levei-o também a conhecer o Barro Preto. Ficou muito entusiasmado com o Barro Preto e com a possibilidade de usar o ginásio da rua Ouro Preto. Perguntei pela reportagem que falava em uma possível aliança com o Atlético e ele disse que não havia nada entabulado com o time rival. Pediu que eu marcasse uma reunião com Zezé Perrella para iniciarmos as conversações. Achar Zezé Perrella? Naquele momento vi que estava enrascado...
Fui para casa e redigi a minha mensagem de final de ano e mandei-a por SMS para meus amigos, inclusive para Zezé Perrella. Qual não foi minha surpresa ao escutar o meu celular tocar e falar Zezé Perrella! Realmente o destino estava conspirando a meu favor e a favor do volei mineiro. Zezé começou o diálogo me zoando pelo teor da mensagem que falava sobre os 120 anos da chegada de meu avô ao Brasil. Aproveitei que ele estava de bom humor e combinei tudo para o primeiro dia útil do ano seguinte. Telefonei para Vitorio que me atendeu! Marquei tudo com ele também.
No dia da reunião compareci na sede administrativa e tivemos nossa reunião, da qual participaram Zezé, eu, Claret e Lemos pelo Cruzeiro e Vitorio e Flavio pela SADA. Mais tarde apareceu também por lá o Gilvan. A conversa evoluiu bem e a empolgação de Zezé propiciou o acordo, pois a princípio o nosso diretor de marketing não se mostrou muito favorável. Segundo ele, o negócio do Cruzeiro é o futebol e não outros esportes. Respondi que o Cruzeiro chama-se Cruzeiro Esporte Clube e não Futebol Clube.
Devo enfatizar que o grande entusiasta do SADA Cruzeiro foi Zezé Perrella. Assim como eu, viu na parceria a oportunidade de fazer do Cruzeiro uma potência olímpica que canalizaria recursos de leis de incentivo ou mesmo de patrocínios federais ao esporte especializado.
Foram muitas as dificuldades de levar a termo a união SADA Cruzeiro, pois foram muitas as desconfianças por partes de alguns conselheiros que militam no Barro Preto. Intrigas e notícias mentirosas foram plantadas pelos que não apoiavam ou viam na minha iniciativa uma possível possibilidade de crescer politicamente.
Com o tempo as resistências foram diminuindo, à medida que as vitórias foram acontecendo e recebemos o apoio da torcida azul. Deve-se ressaltar que o apoio do Dr. Lemos e Dr. Gilvan também foram fundamentais nos momentos mais difíceis. A credibilidade dos dois junto aos conselheiros facilitou muito.
Hoje em dia a parceria já se consolidou. O departamento de marketing do Clube apóia muito as iniciativas do volei e o nome do Cruzeiro está também muito valorizado no meio esportivo especializado. Já não se consegue pensar no volei mineiro hoje sem a presença das cinco estrelas tri-campeãs e dos oito milhões de guerreiros das quadras.
Em tempo: gostaria muito que o rival conseguisse montar também uma bela equipe de volei. Batê-los no volei também seria muito gratificante!



sábado, 21 de janeiro de 2012

O dia em que votei contra o Zezé Perrella

Uma das belas lembranças que trago de minha infância é a dos almoços em família. Na década de 1960 Belo Horizonte era uma cidade tranquila e pacata. Meu pai trabalhava no Bemge da Praça 7 e almoçava todos os dias em casa. Era muito gostoso, todos os dias, às 12:30 nos reunirmos para o ritual de espantarmos as moscas da sala de jantar e almoçarmos juntos: meu pai e minha mãe e os quatro filhos. Era sagrado.
Um dos assuntos prediletos de meu pai era o futebol e particularmente o Cruzeiro Esporte Clube. Meu pai dizia que, no início do ano de 1921, meu avô, o italiano Antonio Cescotto, em uma viagem à capital mineira participara da reunião acontecida na Società di Monte Socorso onde fora fundada uma equipe de futebol de italianos. Assim sendo, toda a família nutria uma admiração muito especial por aquele time de garotos que assombrava o Brasil batendo os grandes do Rio de Janeiro e São Paulo. O bom Anísio Ciscotto também gostava de contar sobre os bastidores do clube do Barro Preto, com as informações privilegiadas que conseguia com um amigo "Conselheiro do Cruzeiro". Era tão grande o orgulho que tinha de dizer que tinha um amigo conselheiro, que me passava a impressão de que era o melhor e mais especial amigo que tinha.
Os anos passaram, os filhos casaram e a amizade com o Conselheiro continuara intacto.
Em 1991, por uma das ironias do destino, vendi minha cota do Minas Tênis Clube e comprei uma do Cruzeiro Esporte Clube. Em 1994 fui convidado pelo então Presidente do Cruzeiro, o italiano César Masci, para fazer parte da chapa que concorria ao Conselho Deliberativo. Aceitei e fui eleito. Acho que meu pai chorou de emoção por uma semana, pois agora tinha não só um amigo Conselheiro, mas também um filho Conselheiro. E mais: agora havia um Conselheiro que tinha o seu nome e sobrenome!
Participei de várias reuniões e sempre fui muito ativo e atuante. Em 1994 votei em Zezé Perrella para Presidente, que foi eleito para um mandato de dois anos. Junto à eleição de Zezé, foi reeleito como Presidente do Conselho Deliberativo o meu grande amigo e padrinho político Djalma José Fernandes. É interessante reparar que o mandado do Presidente do Clube era de dois anos e o de Conselheiro era de três anos.
Havia uma movimentação política dentro do Conselho com o escopo de igualar os mandatos. Tal movimento era apoiado pela diretoria do Clube, tendo em vista que, elegendo o Conselho Deliberativo juntamente com o Presidente do Clube, as chances de se evitar uma oposição no legislativo Cruzeirense seriam grandes. Assim sendo, foi marcada uma reunião com fulcro na mudança do estatuto, acertando os prazos de mandatos, os períodos eleitorais, a forma de eleição e também a proibição de reeleição do Presidente do Conselho Deliberativo. Também continha um adendo, dizendo que o Presidente do Clube teria direito a uma reeleição. Como era um novo estatuto, entendeu-se que o Presidente Zezé Perrella "zeraria" a contagem de seus mandatos, tendo direito a um mandato de três anos e mais uma reeleição. Foi o que aconteceu e Zezé ficou como Presidente do Cruzeiro por oito anos.
Na reunião que aconteceu com o salão de festa do Parque Esportivo Barro Preto lotado, houve uma explicação do que se modificaria no estatuto. Como o Conselho do Cruzeiro é repleto de advogados, procuradores e desembargadores, a polêmica foi grande. Gilvan teve muito trabalho naquela noite. Quando chegaram na parte que proibia o Presidente do Conselho Deliberativo se reeleger, pedi explicações, alegando que o Presidente Djalma, era uma pessoa de escol e muito bem preparada para o cargo. Aleguei que se o Presidente do Conselho Diretor tinha a prerrogativa de se reeleger, o do Conselho Deliberativo também deveria ter. Gilvan explicou a todos que seria uma maneira de proporcionar a mais Conselheiros a possibilidade de ter a honra de assumir tal cargo. Achei uma injustiça com o Dr. Djalma e não concordei.
O Presidente do Conselho convocou então os Conselheiros para que aprovassem o estatuto pelo voto, pedindo aos que concordavam com a nova redação do estatuto ficassem assentados e os que não concordassem ficassem de pé. Sem pensar muito, levantei-me instantemente.
Aí, vi o passo enorme que tinha dado. Somente eu, César Masci, Sérgio Ferrara, Obregon Gonçalves, o Flávio, filho do Dr. Djalma e mais uns três gatos pingados, ficamos de pé. 
Como foi constrangedor para mim! Eu, recém chegado ao Conselho Deliberativo, já votava contra a imensa maioria! E como fui fuzilado naquela noite com os olhares desaprovadores da mesa diretora! Bem, sentar de volta eu não podia, seria um vexame. Fiz cara de mártir das idéias e liberdades e me mantive em pé. O Presidente deu por aprovado o novo estatuto e pude então me assentar.
Pensei comigo mesmo que minha carreira de Conselheiro estava acabada pelo meu voto destoante, que seria evitado por todos e viraria um pária. Afinal, todos os que votaram contra eram ex-presidentes ou do Clube ou do Conselho. Eu não. Eu era um jovem Conselheiro muito abusado. 
Para minha surpresa, o que mais recebi foram palavras de elogio pela minha atitude. Inúmeros colegas vieram apertar minha mão e cumprimentar-me pela minha ousadia e coragem: É disso que o Conselho precisa, de gente que tenha coragem de expor suas ideias! Até o Zezé veio conversar comigo e me cumprimentou e incentivou. Apenas um vice-presidente veio me puxar as orelhas. Me disse que eu já poderia me considerar fora da chapa para o Conselho nas próximas eleições!
Procurei depois o decano dos Conselheiros, o Dr. José Francisco Lemos Filho, que é na verdade um paizão de todos: ex-Presidente do Clube, ex-Presidente do Conselho Deliberativo, à época Vice-Presidente de Zezé Perrella. Expliquei que meu voto contrário visava simplesmente mostrar minha posição contrária à saída do Dr. Djalma. Se o Zezé ganharia mais um mandato, que o Dr. Djalma ganhasse também. Dr. Lemos me tranquilizou e disse que meu voto contrário era necessário para mostrar a todos que o Conselho do Cruzeiro não era "uma vaquinha de presépio" e que a liberdade de opinião era presente em nossa corte maior.
A partir daquela reunião, ganhei um rótulo de "independente", que perdura até hoje. O fato de ter mostrado publicamente meu descontentamento me proporciona, até hoje, a felicidade de ser procurado pelos amigos do Conselho me pedindo minha opinião em assuntos importantes do Clube e também meu posicionamento nas votações. É bom ter o respeito dos amigos.
Vale a pena ressaltar, que tenho comigo que aquele voto também me deu algum prestígio eleitoral e, nas últimas eleições para o Conselho Fiscal, tive convite de três das quatro possíveis chapas que vieram a se mobilizar para o pleito. Duas postularam os votos e a minha foi a vencedora.
Bem, finalizando, após a reunião, fui até a casa de meu pai e lhe contei o que sucedera. Ele me deu um forte abraço e me aconselhou: o voto é seu e ninguém pode votar por você. Fez muito bem. Vou contar para o meu amigo Conselheiro e ver se ele teve a sua coragem!
Não sei o que o amigo Conselheiro falou.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O dia em que a torcida do Cruzeiro gritou meu nome no Mineirão!

O dia em questão foi 20 de novembro de 1991, data da finalíssima da Supercopa dos Campeões da Libertadores das Américas. Foi um dia de muitas glórias, mas também de muito trabalho. 
À época, eu era Gerente Adjunto da Agência Barro Preto da Caixa Econômica Federal. Havia pouco tempo, a Minascaixa havia fechado suas portas e nós, da Caixa Federal havíamos assumido as contas da instituição extinta. Dentre essas contas, havia uma jóia: a conta do Cruzeiro Esporte Clube. Para mim, foi uma felicidade sem fim: fazer o pagamento dos salários e prêmios dos jogadores e ídolos, ser conhecido por eles e principalmente, ter acesso às instalações da Toca da Raposa era a realização de vários sonhos ao mesmo tempo.
Naquele dia, em questão, com o time concentrado, recebi a missão de entregar aos jogadores os recibos de depósito referentes ao pagamento do "bicho" pela classificação na semi-final nos pênaltis sobre o Olímpia do Paraguai. Benecy Queiroz me mandou a lista de créditos e após autenticarmos os depósitos, me dirigi à Toca da Raposa. Vale a pena relembrar que anteriormente, eu ia com uma mala cheia de dinheiro e pagava a cada um em espécie, um perigo em termos de segurança. Sugeri e Benecy aprovou, que fizéssemos os créditos em conta e entregássemos os recibos.
Era assim: cada atleta era chamado individualmente na sala da comissão técnica e, na presença do Benecy e do técnico (o saudoso Ênio Andrade) recebia o recibo e ouvia palavras de reconhecimento e gratidão pelo feito. Eu ficava azul de tanta felicidade de poder partilhar tais momentos!
Logo após as entregas, feitas estrategicamente no dia da finalíssima, deparei com Mário Tilico, Boiadeiro e Marquinhos assentados na porta do vestiário conversando sobre o jogo daquela noite. Perguntei sobre o que fariam com o dinheiro do "bicho", se queriam guardar na caderneta de poupança e ouvi uma pérola do Tilico: Com o dinheiro não sei o que vou fazer, mas no final do jogo sei o que fazer. Caso eu jogue muito bem, faltando uns três minutos para acabar, vou levar as mãos na coxa e pedir para ser substituído. Se eu tiver feito o gol do título, quando eu sair o Mineirão desaba! 
Rimos muito do ponta direita do Cruzeiro, que tinha vindo comprado do São Paulo em mais uma jogada de raposa do nosso presidente, à época, César Masci.
Retornei aos afazeres na Caixa e fui embora mais cedo, pois tinha que estar a postos no Mineirão para continuar minha faina. Com o escopo de agradar o Cruzeiro e encantar o pessoal do futebol, propus ao Benecy, que a partir da abertura da conta, os empregados da Caixa iriam ao Mineirão em todos os jogos para buscar o dinheiro do jogo e despachá-lo através de um carro forte. Pode parecer o óbvio hoje, mas, antes, o dinheiro era jogado em um malote de roupas, e uniformes usados eram jogados por cima, disfarçando o conteúdo do malote. O malote era levado para a Toca da Raposa, colocado em uma sala trancada e no dia seguinte remetido para o depósito na agência bancária. Um perigo! Assim sendo, visando mudar a rotina, propus o carro forte, pago pela Caixa, que buscaria o dinheiro da renda no Mineirão após o jogo e no dia seguinte já entregaria na Caixa do Barro Preto. Benecy aceitou e ficou livre da rotina de ficar aguardando a confecção do borderô, tarefa que agora cabia a mim.
Eu tinha duas cadeiras cativas e ia ao jogo sempre com meu pai, grande companheiro de grandes jornadas cruzeirenses. Foi um jogo de grandes emoções com jogadas fantásticas de um time fantástico! No final, vencemos por 3x0, com um gol de Ademir no primeiro tempo e dois de Mario Tilico, no segundo tempo. Como havíamos perdido o primeiro jogo por 2x0 em Buenos Aires, precisávamos vencer por 3x0. Aos 29 minutos do segundo tempo, Tilico fez o gol do título. Na hora me lembrei da promessa que fizera na porta do vestiário. Virei para meu primo que estava ao meu lado e disse: Tilico não está bem. Sinto que ele terá uma contratura muscular no adutor da coxa esquerda a qualquer momento e será substituído. Meu primo riu, disse que queria que eu dissesse os números do próximo sorteio da sena. Mediante a minha insistência, apostamos uma cerveja que Tilico sairia contundido.
Aos quarenta e quatro do segundo tempo, Tilico leva a mão à coxa, faz o gesto de que quer ser substituído e vai para a lateral ser atendido pelo Dr. Ronaldo Nazaré. O Mineirão quase desabou: Tilico! Tilico! Tilico! O pessoal que estava em volta de mim ficou abismado com o meu conhecimento futebolístico, pois, com quase quinze minutos de antecedência eu vaticinara a contusão. Houve até um que disse: eu vi que desde o final do primeiro tempo ele estava mancando...
Bem, o jogo acabou, Tilico se consagrou e eu corri para completar minha missão: contar o dinheiro da renda, assinar o borderô pelo Cruzeiro, colocar as cédulas no malote e despachá-lo pelo carro forte.
A tesouraria do Mineirão, à época, ficava ao lado das escadarias que vinham dos vestiários, perto do setor de cadeiras numeradas servidas pelo portão de número dois. Os jogadores saiam obrigatoriamente por aquela escadaria e passavam na porta da tesouraria, repleta de soldados da PM que faziam a segurança. A torcida, sabedora que o trajeto dos jogadores era por ali, ficava apinhada na tela que separava a parte externa da interna e saudava os seus heróis que passavam. Naquele dia, campeões de um torneio do calibre da Supercopa, a torcida estava ensandecida e fazia a maior festa nas telas em cima da tesouraria. Enquanto aguardava a contagem do dinheiro pelos funcionários da ADEMG eu ficava na porta e abraçava cada um dos jogadores, que com a minha constante presença na Toca, já havia virado amigo de todos. Passou o Paulo César Borges e eu o abracei e cumprimentei. Nonato e Paulão também ganharam meu abraço. Adílson Batista ganhou um demorado cumprimento com direito a resenha. Célio Gaúcho me pediu uma carona para a Toca da Raposa, pois achava que o ônibus iria demorar bastante. Ademir, Macalé, Luiz Fernando e Charles não se continham em emoção. Boiadeiro me pediu desculpas, pois o recibo que eu entregaria dias depois já tinha destino certo: a compra de uma "bezerrada" no interior de São Paulo. Marquinhos, bom baiano, festejou muito e Tilico então, foi quem eu mais fiz festa, afinal, ganhei fama e cerveja às custas dele. Demos boas risadas.
O mais interessante era que, quando cada um passava, eu cumprimentava e o ídolo seguia por um corredor, com a torcida logo ao lado na tela que gritava a todo pulmão: PC, seleção! Nonato, seleção! Tilico, seleção!
E também para a comissão técnica e diretoria: Ronaldo Nazaré, seleção! César Masci, seleção! Benecy, seleção!! Ênio Andrade, seleção! E eu lá, na maior felicidade, abraçando e comemorando com todos!
No final, quando não havia mais quase ninguém mais para sair dos vestiários, um gaiato da Mafia Azul me chamou da tela e perguntou: quem é você que abraça e conversa com todo o mundo? Eu respondi: sou o gerente do banco que paga os salários deles.
Prontamente a Máfia Azul e demais torcedores entoaram em alto e bom som para meu orgulho e gáudio: Gerente, seleção! Gerente, seleção!
Foi a glória! A torcida do Cruzeiro me pedindo para a seleção. Que pena que o Ricardo Teixeira não estava lá naquela hora.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

A festa na casa do Macalé

Eu acho que foi em 1995. Eu era Gerente Geral da Caixa Econômica Federal em Sabará e já era Conselheiro do Cruzeiro. Era muito conhecido na cidade, justamente por causa desse detalhe. Como Conselheiro eu era um elo de ligação entre a comunidade e o Cruzeiro Esporte Clube, que já àquela época, tinha a esmagadora maioria da torcida daquela cidade. 
Em 1994 levei o Cruzeiro a Sabará para um jogo contra o Siderúrgica, no estádio daquele time, na Praia do Ó. Lembro-me com muito carinho daquela partida, pois em troca de alimentos e roupas, proporcionamos aos sabarenses reviver os grandes espetáculos que lá aconteceram até o final da década de 1960. O Cruzeiro retornava à Praia do Ó e enfrentava o bi-campeão mineiro Siderúrgica com um time misto que tinha craques como Macalé, Webert, Guna, Zelão e até mesmo Ricardinho (que depois se transformou no Mosquitinho Azul) que fez sua estréia com a camisa do profissional naquele dia.
Sabará era uma festa! Um carnaval animadíssimo com a competição entre as escolas de samba Rancho das Flores e Moralistas do Samba. O campeonato de futebol amador não devia nada em animação e rivalidade ao campeonato de futebol profissional da FMF. Marzagão, Alvorada, Botafogo, Ferroviário e muitos outros faziam a festa do povo da mais antiga cidade de Minas Gerais.
Muitos craques de Cruzeiro, Atlético, América e tantos times do Brasil afora são oriundos de Sabará.
Certo dia, com a agência já fechada, escuto alguém bater na pesada porta de madeira do casarão, na praça Santa Rita, onde funcionava a Caixa Econômica Federal. O saudoso vigilante Tião foi abrir a porta e voltou acompanhado de um senhor negro, muito gordo e sorridente. Era o pai do Macalé, meio-campo do Cruzeiro. 
Macalé tinha ganhado uma bela casa do Cruzeiro, na sua última reforma de contrato. Eu, como representante do Cruzeiro em Sabará, fui o responsável pelo fechamento do negócio. Uma belíssima casa de dois andares, com uma área muito grande embaixo. Local ideal para churrascos e festas. E era aí que estava o motivo da visita de seu Rebolo (acho que era esse o nome dele). Macalé chamara os jogadores do Cruzeiro para um churrasco na sua nova casa. Na visão do pai de Macalé, problemas se avizinhavam. Me pediu que fosse à festa, pois minha presença inibiria os mais animados.
Liguei para minha esposa e avisei que iria chegar mais tarde, pois iria a um pagode de jogadores de futebol. 
Devidamente autorizado pela esposa, fui para a casa do Macalé, onde um luzidio Escort XR3 conversível decorava a garagem. Entrar na casa foi um custo, pois o time do Cruzeiro quase todo estava lá. E a população da cidade também. Dida, Arley Álvares, Edenílson, Macalé, Cleisson, Roberto Gaucho e tantos outros estavam presentes. Tudo correu muito bem, e minha presença, realmente, tolheu a animação de muitos jogadores. Lá pelas 22:00hs, começaram a ir embora e eu também me preparava para sair, quando a mãe de Macalé veio me falar que o Cleisson tinha sido detido pela polícia militar por desacato. Lá fui eu para a delegacia tirar o jogador do problema. Como gerente da Caixa e pessoa muito estimada na cidade, convenci o delegado que o Cleisson não tivera a intenção de ofender o PM ao chamá-lo de "gambé", pois ele mesmo, o Cleisson, era filho de um policial militar. Quando voltei para a casa do Macalé, não havia mais ninguém. todos haviam saído para outros lugares, ficando livres do Conselheiro dedo-duro. Devo ressaltar que o Macalé não saiu. Ficou em casa.
Fiquei sabendo, no dia seguinte, que foram para uma boate onde agrediram pessoas, se embriagaram e até mesmo bateram carros. Uma lástima.
O jornalista não teve o escrúpulo de verificar a história e publicou que a esbórnia havia acontecido na casa do Macalé, o que não aconteceu. Macalé foi punido por Zezé Perrella, que mal informado, resolveu mostrar o seu pulso de Presidente recém eleito.
Fui à Toca da Raposa e contei o que ocorrera ao Zezé e comissão técnica, mas não me deram ouvidos. Os jogadores que foram à festa, ficaram contra mim, pois achavam que eu havia dedurado. Os que não foram ficaram com raiva, pois achavam que eu estava defendendo os irresponsáveis.
Saldo da epopeia: fiquei queimado por um bom tempo com os jogadores.
Essa é a minha versão sobre o ocorrido em Sabará. 
Sabará, terra da jabuticaba, do ouro e do povo mais feliz e animado de Minas Gerais. Sou cidadão honorário de Sabará, e como tenho orgulho e sou agradecido por isso!